Boa noite a todos, gostaria de fazer um apelo em cima de um texto de autodescoberta meu que ainda se torna contemporâneo, mesmo com o passar do tempo. Como muitos já devem saber, amanhã é o dia da conscientização do autismo e sinto a necessidade enfatizar em prol desse dia um preconceito que nos é acometido e constantemente alimentado no mais discreto e cruel hábito do início de nossas vidas: o bullying. Sei que é muito fácil encontrar vítimas e agressores na história, mas nunca encontramos a fonte que nos debilita diante a essas cenas complexas e de intensos sofrimentos.
Isso não seria diferente no caso da inserção social de pessoas com deficiência e o autismo, mas há algo que lacera ainda mais neste ramo que nos outros, por conta da natureza em si do objeto de violência. Poucas pessoas sabem, todavia o bullying é um fenômenos de esfera social que é utilizado como empecilho segregante com o passar dos anos da civilização humana. A sua fonte de sustentação não é a exposição de um "Ego superior" em relação à vítima, infelizmente isto deixa-se implícito pelo uso da força e da abusividade (o que não é verdade), e sim o enaltecimento de uma figura desgarrada de um padrão comum como a fonte de vários problemas ilusórias - chegando a certos casos de bullying, em que o agressor identifica aquela pessoa como toda a fonte de sua infelicidade e a única oportunidade para ascender sua imagem no meio social.
Logo, a pessoa com uma fobia social, um foco acentuado a certas atividades ou objetos de fascínio, uma não conformidade estético-comportamental e uma oscilante inteligência emocional (características frequentes dentro do transtorno do espectro do autismo); não só se encontra sob barreiras de imersibilidade num meio social, ela infelizmente acaba sendo marcada como um alvo de estranheza por se tornar nítido que ela não vive numa utopia idealizada e tão pouco todos além dela. Reconhece-se ao ser notada que o mundo em que vivemos é muito mais amplo e imprevisível que o imaginado, neste processo todos se dão cara com o desconhecimento e o terreno desconhecido não tratado é o habitat da ignorância e, dela, o medo. Não somente se torna cada vez mais óbvio que as formas de "criação cidadã" passadas são imperfeitas e mais que ultrapassadas à inclusão social e ao assunto de como se lidar com a imperfeição, como que elas são um problema à criação das juventudes se elas excluem de seus valores as pessoas mais individualizantes e parabenizam o individualismo. Não se cria uma sociedade justa se orientando pelo normalismo, mas sim pelos diálogos existentes em seu mosaico.
Neste ponto, após 2 anos da escrita do meu texto e por ter perpassado pela retirada de minha máscara social (a qual fui obrigado por muitos anos a me adequar para me refugiar desses episódios de estranhezas), me deparo com um comentário inquietante acerca da minha opinião crítica a respeito de mim mesmo e pelo o que passei - acentuando-se por atualmente eu trabalhar com a área da educação e ter uma consciência maior que no passado. Desde o meu primeiro dia de aula a até os meus últimos dias de faculdades, não reparei grandes mudanças na visibilidade dessas pessoas em nossas matrizes de referência ao ensino, se entrega essa função à educação dos pais (a qual é muitas vezes carente) e, quando se torna nítido que eles não possuem domínio do assunto, joga-se essa responsabilidade a uma matéria escolar (antigamente era no ensino de filosofia, o qual foi retirado; atualmente no ensino de artes, onde o conteúdo se torna disperso a inúmeros assuntos). Não devemos esperar que isto seja trabalhado nas séries mais avançadas ou numa palestra/hora cívica que os alunos pouco dão importância, a obrigatoriedade do ensino às pluralidades já está atrofiada de há tanto tempo esperarmos uma medida de implementá-lo, justamente por esta razão há tanta disseminação de pós-verdades entre os pais e ainda mais entre os jovens.
Por essas e outras razões, a crueldade de se empenhar a uma pessoa desastrada a característica de "autista", se passa despercebida e com uma inquietante normalidade preconceituosa; parecendo comédia todo o nosso sofrimento, parecendo que somos monstros e a imagem do erro que se é cultivado há tempos imemoriais entre nós. Tal erro é prezar pelas qualidades alheias e excluir o que consideramos "defeitos", em suma, uma sociedade que não toma lição com seus próprios erros e busca sempre um mártir de seu escárnio.
Segue então, o meu texto de 2 anos atrás, o qual fora escrito quando eu ainda estava tentando adentrar ao meio universitário por meio do ENEM (o qual não foi fácil, mas é assunto para outro artigo):
"Meu nome é Dácio, tenho 19 anos e sou Asperger. Desde pequeno eu apresentava traços do espectro autista: rotina por rituais, dificuldade na fala, seleção alimentar, isolamento e preferências não convencionais (se apegar a um tipo de objeto ou peça de roupa). Pode-se dizer que aprendi a usar a internet e o computador, antes de aprender a falar. Tenho um irmão de 10 anos, chamado Gabriel, que possui autismo clássico; o qual melhor me entende e luto para ajudá-lo. Sempre soube que não era como as outras crianças e jovens - até me identificava com o meu irmão, enquanto os meus amigos saíam para jogar futebol e ir para a balada, assistia documentários científicos e lia livros de Lima Barreto (meu favorito é "A Nova Califórnia"). Sempre gostei de filosofia, biologia e matemática; me lembro de quando eu tinha 5 anos e lia os livros de medicina de meu pai, o meu "3 porquinhos" era "Medicando com arte". Em contra partida à minha excentricidade, passei a minha vida inteira sendo chamado de "enciclopédia humana" e "CDF".
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